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Direção...





Onde está a bússola?
Não encontro orientação.
Sou um feixe de cores
Olvidado da direcção


Passa o vento, aqui, o vento
Que as oliveiras dançam num sonho
Não procuro mais da vida
A não ser o futuro


Mas, onde está o futuro?
Onde é o futuro?
Tenho procurado o rumo incerto nas estrelas
Mas não o descubro


Simetrias estrangeiras
Que me sussurram outro sentido
São espectros vorazes
Que transformam o que não sinto


Onde está o sonho?
Dentro do meu sono, aqui?
Não há sonho não,
É só a noite escura
Que se apoderou de mim.


E no beijo
Mel de ilusões
Intensifico-me no gesto
E aponto para a frente
À procura do teu sabor…


Será lá o destino?
Será lá o amanhã?


Olho a bússola mais uma vez
A agulha indica-me o que não vi
Sou um feixe de cores
Sempre em direcção a ti.


Pedro Barão de Campos.

Liberta-me de tudo




Solta-te
Liberta-me de tudo
E deixa-me vazio...
Um recipiente abandonado
Numa estrada por onde a guerra já passou

Solta-te
Deixa-te ir num fluir que já não há
Ser talvez o que já não podes ser
E acontecer-te nunca e sempre
Numa espera que não alcança

O que faço aqui, a olhar para ti?
Foi sempre assim?

Percorri tantas vezes o caminho mais difícil para te encontrar
Escondi-me tantas vezes, fugi...!

Para quê?
Porquê?

Talvez, na sombra, entenda melhor o efeito da luz sobre os corpos
Talvez, ao relento, com o vento a massajar-me o pensamento
Encontre o inevitável fascínio
De uma montanha em aguarela colorida
E a tua figura como medida
Da excitação fulgurante e febril...
Do teu sorriso sublime.


Mas, porquê?
Porquê, gostar assim de ti?

Solta-me, pensamento cruel!
Liberta-me de tudo!
Deixa de existir em mim!



Pedro Barão de Campos.


Deslumbre





Deslumbre
Em ti, sublime
Afasto-me ao aproximar-te de mim

A cada cortina de vento
O esboço ondulante do teu cabelo
Contornos de tudo
E a paisagem do mundo
É o que encontro em ti


Na boca invento uma janela
Nos olhos, a doçura selvagem do teu sentir
A pele é a fronteira
De um universo inteiro
Por descobrir


E as mãos
Sempre as tuas mãos
Divagantes, voadoras, agitando a alegria pelo ar vazio
Como asas
Como melodia
De um som
Impossível para mim...

Pedro Barão de Campos.

Pedra




Palavras... gestos... olhares...
O que é isto de pensar? O que é isto de sentir?
Que coisa é esta que persiste a tudo e não cessa...?
Esta doença crónica que é ter sempre pensamentos sobre as coisas...
Que é sempre sentir algo...

Porquê?
Porque não sou apenas como a árvore do bosque?
Imóvel, plácida, sublime... viva...

Ou talvez, uma pedra
Porque não nasci pedra?
Hoje, penso que, se fosse uma pedra, seria mais feliz.

Estaria tranquilo, seria resistente
E como as pedras não estão vivas
Nunca teria de me confrontar com dilemas e pensamentos
Nunca teria de enfrentar a morte ou a solidão

Porque simplesmente as pedras são aquilo que são
São pedras, apenas pedras... duras, imóveis, frias...
Pedras... só pedras... que não filosofam, nem imaginam, nem supõem!

Pedra, é o que eu deveria ser.


Pedro Barão de Campos

Inconsequente


Pintura "eggscapism" de Duy Huynh


Fico sem saber o que fazer
Completamente desarmado, desprendido, nulo!
No horizonte vejo já a tua ausência futura...
Como sorrirei sem a expectativa de encontrar os teus olhos no caminho dos meus
No início de cada dia?

Sinto que tudo é inconsequente...
Para quê acordar?
Para quê sentir?
Para quê interrogar-me assim?
Se amanhã, depois de ti, tudo será o sentido de não ter sentido...

Deitar e adormecer...
Apenas porque estou vivo...
Que o sublime já só está em livros e filmes.

Por aqui, o estabelecimento encerrou definitivamente,
Por insolvência da alma,
Hipotecada por conta da solidão.

Fui, ontem, a expectativa e a esperança.
Hoje sou a folha branca.
Por dentro, implodi!

Pedro Barão de Campos.

Por dentro do pensamento - III - O Rio

Pintura de Duy Huynh -  Whatever Floats Your Boat



III




Estás residente no pensamento
E não consigo desalojar-te
Impregnas-me de saudade
Que a tua alma é agridoce
                                                                                                                                                       .

Por dentro do pensamento
És a fluidez dinâmica de um acontecer sem escapatória
Como um barquinho de papel ao sabor da corrente do rio 
No seu curso até ao oceano.
                                                                                                                                                       .

É que, tal como a água do rio, que evapora, se condensa e precipita
Ainda assim, esses pingos de chuva que caem, são pingos feitos da água desse rio... 
São essa substância figurada
Que transcende o entendimento.
                                                                                                                                                       .

É por isso
Que sou sonho e utopia e ilusão...
E sou esse rio imenso que passa entre as margens do tempo
E tu, és essa água que lhe dá forma e cor e vida
E se não fosse a água que habita o rio
O rio seria nada
E eu não seria o rio!
                                                                                                                                                      .

Assim será
Sem o deslumbre desse incolor movimento
O rio secou.




Pedro Barão de Campos.

Por dentro do pensamento - II



Pintura de Duy Huynh - A Chorus From The Brain Forest

II



Será que as paredes me escutam?
Será que eu próprio consigo escutar o que há do lado de dentro do pensamento?
Que endofasia constante é esta que me alucina?


É tão simples...
Há tanta coisa que me falta encontrar em ti
Tantas perguntas
Tantas respostas sem perguntas
Que o tempo de indagar está no fim...


Ainda estou aqui?
E os sinais, onde estão?


Sou poesia...
Sou poeira...
Mas porque continuo a pensar em ti?






Pedro Barão de Campos.

Por dentro do pensamento - I



Pintura de Duy Huynh - Songbird Sabbatical 

I



Porque estás dentro do meu pensamento
Mesmo quando eu não estou aqui?
Porque és sempre esse gesto e essa cor... tão forte... intensa...
Ainda que feche os olhos e nada vislumbre além do escuro dentro de mim?


Qual é a direção do teu sorriso quando este se incendeia?
Que eu ainda não descobri...!


Por vezes, és como um navio a navegar em maré cheia
E tens velas emproadas... e a direção é a do vento que passa...
Não há bússola que te sirva
Nem carta de marear que me previna
E eu nunca sei o que esperar
Dessa viagem à bolina...


És por vezes a cor da melodia
Que acontece entre o beijo e o abraço
Incolor, à margem da fantasia
És a vertigem no instante sem espaço


É que não consigo não pensar-te
E o silêncio é o esboço de um retrato que transcende o papel
É o expoente da poesia levada ao abstracto
O pensamento cá dentro
É o clímax de todas as metáforas que faço


É que o pensamento está dentro de mim
E tal como a água dentro do rio
Tu és parte desse pensamento... no pensar que acontece aqui.


E se acaso, o pensamento, por razão insólita, fosse alheio ao que sou agora
Ainda assim, tu serias a essência, a substância oculta que persistiria
A tudo o que findasse em mim.






Pedro Barão de Campos.

O lugar do medo






Estou aqui
Onde a noite se precipita
Líquido como um beijo
Leve como o vento
Sou a sombra que não vês
Numa rua que nunca cruzaste.


Rodopio, como num turbilhão
Desloco-me à velocidade do pensamento
Mas o pensamento morreu!
E agora...
O que ainda faço aqui?


Existes tu..
Existo eu...
Muitos mais guardam-se ainda
Dentro do pensamento que morreu


Além, nada mais existe
Só uma utopia
Só uma ausência
Só um silêncio
E então? Para quê?


Para nada! Um vão ser...
Um espaço incolor
À procura de um espectro
E os olhos, onde estão?


Os olhos, esses, redondos, vidrados, num "flow" permanente...
Para que lado estão voltados afinal, no momento em que deixas de respirar?


Será que olham para as paisagens inventadas em cartolinas recortadas com formas da natureza?
Será que se preenchem das visões cinematográficas de quem foram? Serão ainda capazes de olhar?
E o lado de dentro? Onde está o céu azul a enfeitar-te do lado de dentro? 



Mas...
Há qualquer coisa que persiste
Um dedilhar de cores
Um frenesim dentro do sangue a fervilhar
Um correr de alegria atravessando-se ao tempo
A melodia em crescendo a acompanhar-me
Um breve sorriso, o Sol a encadear-te os olhos
As tuas pernas tão perto das minhas pernas
A janela paralela ao infinito
Um piano a tocar... e os dedos nas teclas... acorde após acorde
E o amanhã, sempre ali, ao alcance de um salto!
Mas o salto nunca acontece
Onde está o medo.
E agora...?



Agora, estou aqui, numa estranha espera
Onde a vida se precipita
Líquida como um beijo
Leve como o vento
Sou uma cor que não vês
Numa rua onde nunca foste além da esquina dos teus medos.
Mas a vida é prisioneira
Onde está o medo.


E qual será o lugar do medo?



Pedro Barão de Campos.